segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Escalada em Rocha - Cordas

Antes de tudo existem diferentes tipos de cordas. Apenas um grupo específico dentre todas as famílias e variedades das cordas disponíveis no mercado pode ser utilizado para segurança em esportes de escalada.
Esta categoria é genericamente denominada de corda dinâmica, e são materiais que possuem a capacidade de funcionar como conjunto mola-amortecedor de ação progressiva. Essa genial capacidade permite que escaladores saiam ilesos mesmo quando submetidos ao impacto de desaceleração em quedas da ordem de 30 ou 40 metros, desde que não haja um choque contra a parede ou outro material sólido de qualquer natureza.
Juntamente com a cadeirinha, a corda é a alma da segurança em escalada. É o material que mais sofre deterioração com o uso, tanto de caráter abrasiva quanto estrutural (capacidade de amortecimento de queda). Como se isso não bastasse, é normalmente empregado de forma que impossibilita a instalação de um sistema secundário (backup) de segurança. Isso faz com que esse material careça de atenção e cuidados especiais.
Muitos acreditam que a elasticidade da corda é uma característica especial de um determinado tipo de nylon chamado perlon, mas essa afirmação não procede. As cordas modernas de escalada são fabricados com o mesmo material que se emprega na construção de maiorias das cordas estáticas, tanto de uso esportivo quanto de uso tático e profissional.
Existem outras categorias de cordas que empregam poliéster e polipropileno para alguns materiais de uso específico, mas a grande maioria utiliza fibras de poliamida conhecidas como nylon 6. A única (porém grande) diferença entre as fibras que compõem as cordas dinâmica e as cordas estática é o fato de que as da dinâmica passaram por processos de encolhimento térmico. Esse processo é complexo e normalmente é executado em várias etapas. Esse nylon pré-encolhido é empregado na fabricação das cordas dinâmicas de escalada.
A construção da corda dinâmica tecnicamente conhecida como Kernmantle consiste em um conjunto de feixes da alma torcidos em espiral fechados dentro de uma capa. A maioria das cordas estáticas também são fabricadas com a construção Kernmantle, mas nesse caso geralmente a alma consiste em um único feixe de fibras de nylon 6 (sem tratamento térmico) dispostos paralelamente fechado dentro de uma capa.
A diferença de textura de uma corda dinâmica com uma estática não está portanto no processo de fabricação em si, e sim na diferença de ajuste das máquinas que as fabricam. As capas das cordas dinâmicas são produzidas por máquinas que carregam entre 30 a 40 bobinas de pequenos feixes de fios, trançados em par enquanto que as cordas estáticas são trançados com menos de 20 bobinas. Isso permite que as capas das cordas estáticas sejam tecidas com feixes maiores, o que possibilita a fabricação de cordas com capas mais espessas do que as dinâmicas. O aperto dos pontos na capa da corda estática também é maior do que nas cordas dinâmicas, fazendo com que a capa e a alma trabalhem juntos nesse caso. Nas cordas dinâmica já é importante deixar a capa mais solta em relação à alma, pois se assim não fosse uma das duas partes sofreria mais sempre que houver deformação por tração (esticar).
As características de uma corda deve ser bem analisadas na hora da aquisição e, mais importante ainda, o seu desgaste deve ser monitorado ao longo do tempo. Não se esqueça de que disso depende a sua integridade.
Antes de seguir, vamos entender melhor como funciona a o processo de absorção e dissipação de energia do impacto de uma queda numa corda dinâmica:Absorção de impacto de queda
Uma corda dinâmica moderna funciona como um conjunto mola-amortecedor de ação progressiva. Já foi dito que, considerando-se que uma pessoa saudável convencionalmente consegue suportar a força de aceleração (ou desaceleração) da ordem de 15Gs (15 vezes a aceleração da gravidade) sem sofrer danos físicos ou efeitos colaterais de caráter imediato ou permanente, todos os cálculos são feitos de forma que, em tese, um corpo padrão de 80Kg nunca chegue a sofrer pressão de (des)aceleração da ordem de 1.200Kg (80 x 15).


A absorção e dissipação da energia da queda ocorre basicamente por três processos: deformação permanente, deformação elástica e pelo atrito interno das fibras.
1 - Deformação Permanente: Deve-se considerar este tipo de deformação com especial atenção pois, como o próprio nome diz, é de caráter definitivo. Dito isto fica claro que, se um escalador sofrer duas quedas absolutamente iguais numa mesma corda, o segundo impacto será mais forte do que a primeira.
2 - Deformação Elástica: Uma parte da deformação total sofrida pela corda no processo de amortecimento de queda, retorna gradualmente ao estado mais próximo possível do original. Esse processo de reencolhimento acontece progressivamente e leva um certo tempo. Assim, se você estiver escalando e levar uma boa vaca, esses de perder o rumo da casa, o ideal é que se espere pelo menos 15 minutos antes de submeter a corda novamente.
3 – Atrito Interno: O atrito interno entre as fibras de nylon dissipa a energia da queda gerando calor. Nos pontos de atrito intenso como na curva do mosquetão de impacto e no nó de encordoamento, pode até ocorrer micro fusão (derretimento) de fibras e formam empelotamento da alma.
Na minha opinião particular, a melhor corda para escaladas tradicionais e uso profissional, ainda que extremamente cara e possuir força de impacto elevada, é a Edelweiss Stratos (principalmente em locais com rocha abrasiva ou nas escaladas pesadas). Obviamente as características da corda ideal varia de acordo com o tipo de uso e ambiente.

Como escolher uma corda:


O tipo de corda utilizada para segurança em escalada é conhecida genericamente como corda dinâmica. Alguns dados devem ser observados na hora da aquisição da corda. São eles Elongação passiva (working elongation), Força de impacto (impact force) e, em segundo plano, Quantidades de queda UIAA (UIAA falls). O que vem a significar cada um desses parametros?
Elongação passiva (Working Elongation): Determina o quanto a corda estica quando submetido a uma tração passiva do nosso velho padrão de 80 Kg e, é expressa em %. O valor tem variado em torno de 5 a 9% dependendo do tipo e bitola da corda. Considerando-se que um dos grandes problemas do desgaste da corda é exatamente o fato dela ficar raspando na parede (devido a elasticidade) por movimentação de um corpo nela atado (principalmente durante a prática de subida com jumar), pelo menos no plano teórico, quanto menor a elongação passiva, melhor a corda.
Força de impacto (Impact Force): Determina o impacto máximo atingido também pelo nosso padrão de 80 Kg, quando submetido a um teste de queda UIAA numa corda sem uso. Nesse teste, uma corda de 2,8 metros é atada a um dinamômetro e o corpo sofre uma queda de 4,8 metros (fator de queda da ordem de 1,71). O dinamômetro registra assim a carga máxima de impacto da queda. Teoricamente, quanto maior o amortecimento, melhor a corda. Idealizando-se o equipamento, este deve apresentar um baixo força de impacto.
Antes de se falar em quantidades de queda UIAA, deve-se entender o mecanismo pelo qual ocorre o amortecimento de choque. Quando Uma corda é submetida a um impacto forte, esta deforma muito mais do que os 5 a 9% passivos. Esse valor pode chegar a superar os 20%, numa deformação parcialmente elástica, pois uma parte dela é de caráter permanente. Essa deformação, juntamente com o calor gerado pelo atrito das fibras internas da corda e a energia potencial (a corda volta a contrair logo após a elongação máxima de impacto) é que dissipa a energia da queda. Isso dito fica óbvio que, se a mesma ponta de uma corda for submetida a duas quedas absolutamente idênticas, o impacto da segunda queda será maior do que a primeira.
Quantidade de quedas UIAA (UIAA Falls): Determina quantas quedas do padrão UIAA pode uma mesma parte da corda sofrer antes de atingir o valor crítico de 1.200 Kg no dinamômetro. Se uma corda tivesse a capacidade de auto-recuperar ela poderia suportar sucessivas quedas indefinidamente. Mas como isso é absolutamente impossível, você deve buscar uma corda que tenha alto número em quantidades de queda UIAA.
Assim, a força de impacto determina a carga da primeira queda. A quantidade de queda UIAA diz quantas quedas daquele padrão pode uma mesma parte da corda resistir até o ponto de risco. Essa informação é importante desde o momento que fique claro que a corda aparentemente nova nem sempre é uma corda segura. Uma pessoa que costuma detonar nas escaladas e voar radicalmente deve marcar o histórico de queda de ambas as pontas da corda para se ter uma idéia do mapa de deterioração. Uma corda que esteja deformado permanentemente em mais de 10% do comprimento original possivelmente não estará em boas condições para escaladas com potencialidades de quedas grandes e/ou de alto fator.
Uma corda ideal deveria se comportar estaticamente a baixa carga (elongação passiva 0%), possuir alta capacidade de absorção de impactos fortes (baixo força de impacto) e capacidade de auto-recuperação em que, uma vez aliviada a carga, contraia lenta e gradualmente por si só, de forma que a deformação desaparecesse. Impossível, por enquanto.
Outro ponto que também deve-se considerar é a capacidade de resistência a abrasão. As rochas brasileiras costumam ser mais ásperas do que as encontradas nos países temperados onde são projetados os equipamentos. As cordas macias, ainda que mais gostosas no manejo, mas normalmente sofrem desgastes de abrasão maiores do que as cordas duras.
Um outro cuidado que se deve tomar com as cordas em uso diz respeito aos danos internos. As fibras da alma podem sofrer danos conforme o uso. Podem arrebentar ou ser cortados (por um grão de areia que penetrou pela capa, por exemplo) ou sofrer empelotamento. Para se detectar esses tipos de problema a corda deve ser esticada com força (humana) e apalpada de cabo-a-rabo com as pontas dos dedos. Uma corda que apresenta pelotas, buracos ou variação de diâmetro deve ser aposentada.
Existem algumas características que devem ser consideradas na aquisição de uma corda. Afinal de contas, é um equipamento caro e que garante a sua integridade.


Os tópicos a serem verificados são: segurança, eficiência e durabilidade.

   1- Single, Double ou Twin: As cordas simples, como o próprio nome diz, foram desenvolvidos para serem, digamos, auto-suficientes em condição normal de uso e vem marcados com um número 1 nas pontas. Na maioria dos casos utiliza-se single ropes para esportes de escalada.


Os Doubles e Twins devem ser utilizados em par, e vem marcados com o número 1/2 nas pontas. A diferença entre os dois é que os doubles podem ser costurados um a um, alternadamente enquanto que o twin deve ser sempre costurados em par. Essa técnica é especialmente interessante em escaladas mais complexas onde as condições ambientais são mais agressivas como escaladas em gelo, ambientes alpinos e, em certas vias tradicionais e big walls.


2- Comprimento: O padrão na década de 70 foi 40 ou 45m. Nos anos 80 foi convencionalmente aceito como 50m, mas nestes últimos anos as cordas longas de 60m estão ganhando terreno. Entre as conquistas mais recentes, existem até muitas vias, principalmente em escaladas tradicionais, em que as cordas de 60m são mandatórios. Muitos acreditam que o comprimento deva estabilizar nesses patamares principalmente por causa das dificuldades operacionais em manusear cordas muito longas, mas já existem no mercado materiais de 70m.
Apesar de mais pesada na mochila e trabalhosa para enrolar, muitas vezes, mesmo em vias clássicas, o fato de se ter 10m extras abre a possibilidade de emendar duas enfiadas numa só ou, efetuar paradas fora dos pontos convencionais para executar enfiadas mais longas. Isso resulta no ganho significativo em velocidade.
Para a escalada esportiva possibilita que se faça toprope em vias de até 30m. Uma outra vantagem diz respeito ao dano localizado nas pontas ou no caso de se utilizar a corda para trabalhar uma via, levando sucessivos tombos numa mesma ponta. Após uma temporada pode-se cortar 5m de cada ponta e ainda você fica com uma corda quase-que-nova de 50m.
Para se ter um parâmetro de quando cortar, eu tenho o hábito de marcar a corda no exato ponto de 5m a partir das pontas. Mantenho um monitoramento regular onde, se um dia a deformação permanente nas pontas fizer com que a marca fique a mais de 5,5m (10%) de deformação permanente, corto a corda nesse ponto para recuperar a capacidade de amortecimento.

3- Diâmetro: Do ponto de vista tecnológico pode-se dizer que seria possível fabricar uma corda de 9mm que pudesse ser utilizada como single rope. Obviamente isso traria outros problemas, principalmente no que diz respeito à aparelhos de segurança. Praticamente dodos os equipamentos foram desenhados para serem utilizados com cordas de 10 a 11mm e o emprego de materiais mais finos dificultaria o travamento na hora da queda. Além do mais, as capas tenderiam a ser mais finas e a vida útil da corda diminuiria.
Os single ropes modernos possuem o diâmetro que varia convencionalmente entre 9,2mm a 11mm. A resistência e o peso de uma corda é a razão direta do exponencial do diâmetro. Assim dito fica claro que os extremos foram projetados para serem usados para fins distintos.
As cordas com menos de 10,5mm de diâmetro são basicamente para escalada esportiva e livre, enquanto que os mais grossos são para escaladas tradicionais e Big Walls. Obviamente existem áreas em que a particularidade local exige materiais específicos.
Resumindo tudo, as cordas finas e duras, além de serem leves, deslizam bem na rocha e nas costuras. São os ideais para tentativa on sight ou red point. Os materiais bombers são bons para trabalhar vias e escaladas complexas.
Para aqueles que gostam de double ou twin já está no mercado materiais de até 7,8mm. Uma vez mais, aqueles que optarem por esse tipo de material deve prestar muita atenção, pois o travamento é consideravelmente mais difícil.

4- Textura: As cordas macias são gostosas e seguram melhor os nós. Por estas razões, muita gente acredita que a maciez é o fruto da evolução. No entanto, o surgimento das cordas macias nada mais é do que a especialização dos materiais, que nesse caso específico, foram desenvolvidos para serem utilizados em escaladas esportivas em calcários e rochas menos abrasivas.
Nos ambientes onde a rocha é lisa e macia, as cordas não carecem ser duras. No entanto, para serem utilizados em granitos ásperos ou rochas angulosas (mesmo que seja calcáreo), as cordas macias não são boas. Primeiro porque eles começam logo a levantar pêlos e engordar. Segundo porque agarram mais na superfície da rocha e aumentam o atrito.
Consequentemente na rochas brasileiras, via de regra, as cordas mais duras tendem a ser mais leves, eficientes e duráveis.

5- Capa: Muita gente pergunta-me se é normal uma corda de pouco uso apresentar a capa solta em relação à alma. Na realidade, todas as cordas dinâmicas, uns menos e outros mais, possuem a capa solta. Isso é uma característica importante pois se assim não fossem, as fibras de nylon da capa passaria a arrebentar gradualmente a cada vez que ocorre uma queda. É muito importante que se entenda que a forma com que a alma estica é diferente do da capa. Isso faz com que a capa solta seja uma condição necessária para o amortecimento.
Obviamente não estamos falando de exageros. Algo está errado quando a capa chega ponto de deslizar sobre a alma e/ou formar pontas vazias no fim da corda.
A espessura da capa é quase sempre uma proporção direta do diâmetro. Assim, via de regra as cordas mais finas possuem capa mais frágeis do que as grossas. A regra não vale quando são feitos outros ajustes, por exemplo quantidades de bobinas envolvidos no processo de confecção. No caso da companhia como a PMI, a corda dinâmica de 9,6mm possui a mesma espessura da capa da corda de10,5mm. Isso foi possível, entre outras coisas, por que a quantidade de bobina foi reduzida de 36 para 32.

      6- Alma: As cordas dinâmicas são invariavelmente compostas de alma que é um conjunto de filamentos torcidos em espiral dispostos paralelamente. Estes espirais não estão totalmente esticados dentro da corda e é isso que confere a elasticidade e a capacidade de aquecimento por atrito. A forma espiral dos filamentos quase nada tem a ver com efeito mola, como muitos acreditam.


O número de espirais que compõem a corda varia entre 7 a 13 feixes para cordas de 10,5mm de diâmetro, dependendo do fabricante e do tipo de corda. Via de regra, quanto menos feixes, mais duro e roliço tende a ser a corda.


     7- Deformabilidade da seção transversal: Existem cordas que estão sempre redondilhas e outras que deformam, adquirindo uma seção ovalada ou elíptica. Tenho visto muitas pessoas serem antipáticos em relação às cordas deformáveis, porém esta é uma característica muito importante. 


Quando a corda faz uma curva fechada, por exemplo nas quinas de rochas e nos mosquetões, a curva externa recebe maior tração do que a curva interna. Assim, uma corda que deforma mais tende a distribuir melhor a carga na hora do impacto.